A Saga de Larry Talbot

 
Entre os monstros clássicos do cinema de horror, imortalizados nas telas através das produções em preto e branco do estúdio Universal entre as décadas de 1930 e 1940, o Lobisomem, personificado pelo cultuado ator Lon Chaney Jr, foi um dos que não atingiu o mesmo patamar de popularidade do Conde Drácula, e nem gerou uma franquia tão longa e rentável como a do Monstro de Frankenstein. Contudo, esses detalhes não reduzem a inquestionável importância do personagem dentro da longa e prolífera história do cinema de horror, da mesma forma que não impediu os seus filmes de serem referenciados e cultuados por uma legião de fãs que continuam admirando e preservando o seu legado, mesmo passados mais de sessenta anos do lançamento do filme que apresentou o personagem ao mundo pela primeira vez.
 
A obra em questão foi o fundamental “O Lobisomem” de 1941, que contou com direção do também produtor George Waggner e roteiro do alemão Curt Siodmak. Para os padrões adotados para os filmes da Universal naquele período, pode-se dizer que “O Lobisomem” foi uma verdadeira “superprodução”, levada a cabo com planejamento e esmero, concentrando todos os esforços do estúdio no intuito de elaborar uma obra que deveria obrigatoriamente se tornar um grande sucesso nas bilheterias. A preocupação dos executivos da Universal se justificava pelo fato de que a investida anterior do estúdio em um filme de lobisomem com o subestimado “O Lobisomem de Londres”, de 1935, havia sido um redundante fracasso de público e crítica, embora na verdade, o filme estivesse muito longe de ser ruim, tanto que hoje em dia se constitui em uma obra reconhecida e apreciada pelos verdadeiros fãs do gênero.
 
Para evitar que o fracasso se repetisse com o novo filme, a Universal se cercou de uma série de cuidados, como deixar o roteiro a cargo do badalado Curt Siodmak, e principalmente, investir no recrutamento de um elenco de peso, uma vez que o fraco desempenho dos atores principais de “O Lobisomem de Londres” vinha sendo apontado como a principal causa da má aceitação do filme por parte do público. Dessa forma, foram contratados Claude Rains, astro de filmes como “O Homem Invisível”, “O Vidente” e “O Fantasma da Ópera”, e que ao longo de sua carreira recebeu nada menos do que seis indicações ao Oscar, Bela Lugosi, o eterno conde vampiro do clássico “Drácula”, a russa Maria Ouspenskaya, que também trazia no currículo duas indicações ao Oscar, o inglês Patric Knowles, que na época era uma jovem promessa a galã, e no papel principal Lon Chaney Jr, filho de Lon Chaney, astro do cinema mudo, conhecido com “O Homem das Mil Faces” e que atuou em filmes como “O Corcunda de Notre Dame” e na primeira adaptação de “O Fantasma da Ópera”. Além disso, o grande maquiador Jack Pierce, responsável pela caracterização de todos os outros monstros clássicos da Universal, havia sido incumbido de elaborar a maquiagem do lobisomem, acrescentando-se assim o nome de mais um profissional conceituado para a produção do filme.
 
Apesar de alguns contratempos, como a necessidade de se fazerem modificações no roteiro em meio às filmagens, e algumas desavenças entre atores e integrantes da equipe de produção, o filme foi extremamente bem-sucedido, atingindo plenamente as expectativas da Universal e se constituindo numa das maiores bilheterias obtidas pelo estúdio naquele período.
 
Entre os extras da versão nacional do DVD do filme, existe uma interessantíssima trilha de áudio com comentários do historiador de cinema Tom Weaver, que traz uma série de revelações e informações diversas sobre os bastidores da produção e os profissionais que nela trabalharam, e também sobre os filmes seguintes onde o personagem do Lobisomem apareceu. Entre as pérolas mencionadas por Weaver, está o relato dando conta de que Lon Chaney Jr, ao mesmo tempo em que se revelava um grande ator, se mostrava também um cara beberrão e totalmente temperamental, que vivia arrumando encrenca com os outros atores e principalmente com o maquiador Jack Pierce. Weaver afirma inclusive que Chaney e a atriz Evelyn Ankers, que interpretou a mocinha Gwen Conliffe, não se suportavam, chegando a ponto de brigarem já no primeiro dia de filmagens, por causa de um camarim que Chaney gostaria de usar e que havia sido cedido para a atriz.
 
Curiosidades à parte, o enredo do filme já é de conhecimento de todos, mas caso você ainda não tenha assistido e não quiser tomar conhecimento de detalhes reveladores sobre a trama, pule para o parágrafo seguinte, pois este contém Spoilers: Depois de muitos anos morando nos EUA, o jovem Larry Talbot (Lon Chaney Jr) retorna para o País de Gales com o objetivo de assumir o controle dos negócios da família. Certa noite, Talbot é atacado por um lobisomem (Bela Lugosi) e acaba matando-o com golpes de sua bengala ornamentada com prata. Mas por ter sido mordido, Talbot também passará a se transformar em lobisomem nas noites de lua cheia, espalhando o terror e a morte entre a população de sua aldeia natal, até ser morto pelo seu pai (Claude Rains), ironicamente, com golpes desferidos com a sua própria bengala de prata. Motivados pelo grande sucesso, os executivos da Universal deram sinal verde para a produção de novos filmes abordando o personagem do Lobisomem, da mesma forma com que foi feito com Drácula e Frankenstein. Curiosamente, o amaldiçoado personagem de Larry Talbot nunca mais apareceu em um filme solo, mas sim participando de crossovers, filmes que uniam sob um mesmo enredo dois ou mais personagens clássicos do estúdio, algo visto recentemente em “Freddy Vs Jason” e “Alien Vs Predador”, e que foram uma grande inovação para a época.
 
Tentando encontrar uma forma de se livrar de sua maldição, ou simplesmente empenhado em sabotar os planos maquiavélicos do Conde Drácula, Larry Talbot apareceu em mais quatro filmes além do original, sendo eles “Frankenstein encontra o Lobisomem”, de 1943, “A Casa de Frankenstein”, de 1944, “A Casa de Drácula”, de 1945 e “Abbott e Costello encontram Frankenstein” de 1948. E são justamente esses filmes o foco da série de artigos que se sucederá, abordando a árdua e fascinante saga desse que é o mais famoso lobisomem da história do cinema.

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