Black Sunday – A Máscara de Satã aka A Maldição do Demônio (La Maschera Del Demonio aka Black Sunday aka The Mask of Satan)


No ano de 1960, a estreia oficial de um diretor italiano iria revolucionar não só o cinema de horror da Itália, mas também o cinema de horror mundial e transformaria sua atriz principal num ícone do gênero. O nome do diretor é Mario Bava, a da atriz é Barbara Steele e o filme em questão é “La Maschera del Demonio”.

Vamos recuar um pouco no tempo, mais precisamente no período anterior a segunda Guerra Mundial, a Itália era um dos maiores polos cinematográficos do mundo. Com o país sobre o comando de Benito Mussolini, os fascistas coíbem e censuram as produções do período, varrendo de vez o cinema fantástico, o de horror mais precisamente, do país da bota.

O cinema de horror italiano só renasceria em 1956, com “I Vampiri”, uma obra irregular resultado de uma produção tumultuada, aonde o diretor Riccardo Freda, simplesmente abandona as filmagens, reclamando do orçamento minguado e do cronograma apertado, é quando entra em cena o responsável pela fotografia, Mario Bava, que assume a direção e com tempo recorde e sem extravagâncias orçamentárias, termina o filme. 
Embora boa parte de “I Vampiri” tenha sido dirigido por Bava, os créditos ficaram apenas para Freda, mas como consolação, os produtores ofereceram para Bava a oportunidade de estrear oficialmente com o projeto que o próprio diretor quisesse. E assim surgiu “La Maschera del Demonio”.

Inspirado livremente no conto “Viy” de Nicolai Gogol. O filme começa na Moldávia do século de XVII, aonde a princesa Asa Vajda (Barbara Steele) e seu amante Javutich (Arturo Dominici) são condenados pela inquisição por assassinatos, vampirismo e bruxaria.

Claro que antes de ser executa nossa protagonista arranja tempo de rogar uma praga para o inquisidor e de que voltaria nas gerações futuras.

Esta cena de abertura é um primor de elementos fetichistas e sadomasoquista, e impressiona até hoje. Com a Princesa amarrada em um tronco, cercado de carrascos encapuzados. Primeiro a moça é marcada a ferro quente nas costas com a letra “S”, a marca de Satã. Depois entra em cena a máscara do demônio do título, um adereço cheio de pontas afiadas na parte interna e que é cravada na cara da protagonista na base da marretada mesmo. O seu amante Javutich já se encontra morto e com a máscara cravada no rosto.
O passo seguinte seria cremar o cadáver da jovem bruxa, mas uma chuva atrapalha o trabalho dos inquisidores. A solução será enterrar Javutich em terra não consagrada e deixar a Princesa Asa num mausoléu, com um caixão especial onde o rosto do cadáver fica exposto por uma pequena janela e onde fica visível uma cruz que fica de em pé, em cima do caixão, o que segundo a crença impediria da vampira ressuscitar.

O filme então pula duzentos anos. E encontramos o Dr. Thomas Kruvajan (Andrea Checchi) e seu pupilo, o jovem Dr. Andre Gorobec (o inglês John Richardson, que anos mais tarde trabalharia em “Torso”) atravessando a região, indo para um congresso de medicina. O Dr. Kruvajan pede ao cocheiro que peguem um atalho pela floresta. Um acidente com a roda da carruagem faz com eles tenham uma parada forçada, é quando a dupla de médicos encontra a porta de entrada para a catacumba da princesa Vajda. Graças a um enorme morcego (e muito mal feito, diga-se), o Dr. Kruvajan acaba quebrando a cruz que estava em cima do túmulo e também o vidro da “janela” do mesmo, ou seja, faz uma bagunça completa.
Claro que o médico xereta não se aguenta em ver o cadáver com a máscara e resolve tirar para ver como ficou o defunto, mas ele acaba se cortando nessa operação, e algumas gotas de seu sangue acaba caindo nos restos mortais. E quem já viu pelo menos um filme de vampiro da Hammer sabe o que isso significa.

Enquanto a Princesa Asa Vadja não retorna a vida, a dupla de médicos sai do mausoléu e encontra Katia Vajda (Barbara Steele, novamente), uma descendente da vampira. O jovem Dr. Andre se encanta com a moça, mas como a vida segue, ele e o Dr. Kruvajan, agora com a carruagem concertada, precisam partir para uma hospedaria mais próxima. 
Enquanto isso no castelo onde mora Katia, a família está apreensiva, pois naquela noite completa duzentos anos da morte de Asa, o que significa que voltará a vida para completar sua maldição. Asa já desperta, mas incapaz de se levantar de seu caixão acaba ressuscitando também seu amado Javuvitch por o que me parece ser telepatia. Asa precisará possuir o corpo de sua descendente Kátia para poder se levantar, nem que tenha que matar ou transformar em vampiro quem estiver pela frente. Com isso contará com a ajuda de Javutich e do Dr. Kruvajan, que a está altura já está transformado em um vampiro e o culpado por tê-la ressuscitada.

O fato de Asa ressuscitar e ficar incapacitada, prostrada em seu leito de morte, enquanto Javutich ressuscita de forma energética e serelepe, nunca é explicada pelo roteiro, mas seguimos em frente.

Restará ao jovem Dr. Andre, com ajuda do padre local (Antonio Pierfederici), destruir a bruxa-vampira e seus asseclas, acabando assim com a maldição e vivendo com Katia feliz para sempre.
La Maschera del Demonio” sofreu alguns cortes e ganhou o título em inglês de “Black Sunday” quando foi lançado na Inglaterra. Tanto que outro trabalha de Bava, o clássico “I Ter Volti della Paura” acabaria sendo rebatizado de “Black Sabbath” pelos picaretas distribuidores ingleses, ávidos por capitalizar em cima dos fãs do primeiro filme.

O sucesso de “Black Sunday” foi tanto que não só alavancou a carreira do diretor, que nos proporcionou mais uma dúzia de clássicos do horror, como colocou na vitrine mundial o próprio horror italiano, finalmente renascido das cinzas feitas pelos fascistas.

Apenas em 1992 foi lançado no mercado de vídeo inglês a versão uncut, desta vez rebatizada de “The Mask of Satan”, esta é a matriz que a distribuidora Works usou para lançar o dvd aqui no Brasil no começo da década de 2000, chamado de “Black Sunday – A Máscara de Satã”. Antes o filme tinha recebido nos cinemas o título de “A Maldição do Demônio”, e vejam só: no cartaz brasileiro a tagline transforma a maldição de duzentos anos em dois mil anos!

Curiosamente a dublagem em inglês omite um fato que só existe na versão em italiano: a de que Asa e Javutich eram irmãos. Isso mesmo que você pensou, esse relacionamento incestuoso desapareceu completamente na versão inglesa. Com uma belíssima fotografia em preto-e-branco do próprio Bava, com belos movimentos de câmeras em cenários góticos, o filme é um belo delírio visual.
Sem contar a bela trilha sonora de Roberto Nicolosi, que seria reaproveitado por Bava no episódio “I Wurdulak”, que também trata de vampirismo, do clássico filme episódico “I Ter Volti della Paura”.

O maior trunfo para o sucesso de “La Maschera del Demonio” talvez tenha sido a presença de Barbara Steele, uma atriz que sempre compensou sua falta de talento com muito carisma. Com seus olhos esbugalhados e rosto expressivo, aqui ela encanta tanto no papel da malévola Asa quanto na carola Katia.  Barbara Steele, nascida na Inglaterra em 1937, começou fazendo filmes na terra natal até que surgiu uma oportunidade, em 1959, de trabalhar em Hollywood no filme “Estrela de Fogo” de Don Siegel e estrelado pelo mito Elvis Presley, mas Barbara acaba brigando com o diretor e com o Rei do Rock e acaba abandonando as filmagens. Resolve ir para a Europa, esfriar a cabeça, lá conhece Mario Bava, para a sorte de ambos.

Mas não pense que a relação de trabalho de Bava e Steele eram as mil maravilhas. Steele se mostrava difícil no set, tinha chiliques, às vezes porque não gostava da peruca que iria usar ou pelo decote que teria que mostrar. Ela chegou a se recusar a entrar no set, pois achava que Bava queria que ela ficasse nua diante das câmeras. A própria atriz reconhece as dificuldades que teve durante as filmagens, ela atribui isso a sua inexperiência na época como atriz somada com a sua incapacidade de compreender a língua italiana.

O sucesso de Steele em “La Maschera del Demonio” não só a transformou num ícone do horror, como também abriu portas para que ela trabalhasse em outras produções do gênero, como em “A Mansão do Terror” de Roger Corman, inclusive na própria Itália. Ela não voltaria trabalhar mais com Bava, mas com outros diretores como Anthonio Margheriti (Danza Macabra) e Riccardo Freda (L’Orrible Segreto del Dr. Hitchcock). Barbara ainda está na ativa, participou do fraco “O Segredo da Borboleta” de 2012.

Em “La Maschera del Demonio”, a principio, Barbara Steele e Arturo Dominici, que interpreta o Javutich, eram para usar caninos proeminentes, típicos de vampiros mas Bava não gostou e acabou não os utilizando no filme, embora seja possível encontrar por aí fotos promocionais do filme com a imagem de Barbara usando os famigerados dentes afiados.

Enfim, “La Maschera del Demonio” é mais que um grande filme de horror gótico. É um clássico indispensável, uma obra importante para a história do cinema de horror. Se você ainda não viu, está perdendo tempo.

Black Sunday – A máscara de Satã / A Maldição do Demônio (La Maschera del Demonio / Black Sunday / The Mask of Satan, 1960)
Direção: Mario Bava
Com: Barbara Steele, John Richardson, Andrea Checchi, Arturo Dominici, Antonio Pierfederici.

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