Nesse sentido, o exemplo mais conhecido é o do clássico “A
Hora do Lobisomem”, dirigido por Daniel Attias em 1985, com roteiro de
Stephen King baseado em um livro de sua própria autoria, onde vemos um
casal de irmãos tentando a todo custo descobrir a identidade do
lobisomem que vem trucidando os habitantes da cidadezinha onde vivem,
antes que a criatura venha ao encalço deles próprios. Quando a
identidade do monstro é revelada, não deixou de causar um considerável
impacto, principalmente pela ousadia. Outro trabalho emblemático onde
esse tipo de situação é abordada encontra-se em “A Fera Deve Morrer”,
filme de 1974 dirigido por Paul Annett, onde vemos um excêntrico
milionário reunir em uma mansão isolada uma série de misteriosos
convidados no intuito de descobrir qual deles é um lobisomem, e então
dar cabo da criatura. A própria estrutura desse filme é montada de forma
a instigar quem está assistindo a descobrir a identidade do monstro,
chegando a ponto de parar a ação, instantes antes do final, para dar
tempo do expectador chegar a um veredicto. Pode-se ainda citar “O
Lobisomem no Quarto das Garotas”, produção italiana Classe Z, dirigida
por Richard Benson (pseudônimo de Paolo Heusch) em 1962, onde o roteiro
faz com que tentemos descobrir quem é o lobisomem que vem atacando em
uma escola reformatória para moças. Porém, todas essas obras foram
precedidas por um obscuro filme da Universal produzido em meados da
década de 1940 intitulado “A Mulher-lobo de Londres”, que foi o primeiro
a fundamentar o seu enredo na questão da identidade da criatura
licantrópica, e que, por fim, é o real foco desse artigo.
Lançado em 1946, “A Mulher-lobo de Londres” foi a última
investida da Universal em um filme sério abordando a temática do
lobisomem. Depois deste viria apenas “Abbott e Costello encontram
Frankenstein”, de 1948, onde temos a derradeira aparição do personagem
de Larry Talbot, mas que, como todos sabem, se trata de uma comédia e
não de um filme de horror propriamente dito. Aliás, nem mesmo “A
Mulher-lobo de Londres” deveria ser considerado um filme de horror, mas
sim de suspense.
A história se passa em uma época definida apenas como “na
virada do Século XIX para o Século XX”, e nos mostra uma bela mansão nos
limites de Londres, habitada por Sra Martha Winthrop (Sara Haden), sua
filha Carol Winthrop (Jan Wiley), sua sobrinha órfã Phyllis Allenby
(June Lockhart), e uma velha empregada chamada Hannah (Eily Malyon).
Tudo corre bem na família das mulheres, inclusive Phyllis já está de
casamento marcado para breve com um advogado oriundo de uma família rica
e tradicional chamado Barry Lanfield (Don Porter), até que uma série de
brutais assassinatos passa a ocorrer em um parque nas proximidades da
mansão. Encarregado de investigar o caso, o detetive Lathan (Lloyd
Corrigan) está convencido de que se trata de obra de um lobisomem,
enquanto o cético Inspetor Pierce (Dennis Hoey, de “Frankenstein
encontra o Lobisomem”) acredita que o autor das mortes seja um cão
raivoso, ou no máximo, um maníaco.
Porém, a pobre Phyllis acorda uma manhã com
as mãos sujas de sangue e encontra o chambre e os calçados enlameados,
como se tivesse andado ao ar livre durante a noite. Com isso, passa a
acreditar em uma tal “Maldição Allenby”, que supostamente fazia com que
seus antepassados se transformassem em lobisomem, e que teria vitimado
também os seus pais. Desesperada, a moça termina o noivado com Barry e
se isola na mansão, fazendo com que o inconformado noivo passe a
investigar o caso por conta própria, a fim de provar a inocência da
amada. Paralelamente, ficamos sabendo que existem muitas coisas obscuras
na vida das mulheres daquela casa, como o fato da Sra Martha ter tido
um caso com o pai de Phyllis no passado, as saídas noturnas de Carol,
supostamente para se encontrar com um amante, e a postura pra lá de
suspeita de Hannah, a velha empregada que fica ouvindo as conversas
atrás das portas, e que parece saber muito mais do que procura
demonstrar. Logo, todas são suspeitas de serem a verdadeira Mulher-lobo,
e o expectador fica colhendo pistas e elaborando teorias até o final do
filme, onde a identidade da assassina é finalmente revelada.
Devido a sua curta duração – apenas 61 minutos – o filme flui
com facilidade e o roteiro simples, porém eficiente, faz com que o
expectador fique o tempo inteiro ligado em todos os acontecimentos, na
intenção de antever os detalhes reveladores do mistério. Como a maior
parte do tempo é constituída de cenas de diálogos, e as mortes são quase
todas off-screen, os melhores momentos do filme acabam sendo as cenas
noturnas no parque, onde a escuridão e a densa névoa se constituem no
cenário perfeito para criar um clima de suspense e a conseqüente
aparição da Mulher-lobo. E por falar na Mulher-lobo, o visual dela nada
tem de sofisticado ou elaborado, se constituindo tão somente em uma
mulher envolvida por mantas e casacos, aparecendo na maior parte das
vezes de costas, à distância, ou em meio à névoa, em uma clara
estratégia destinada a dar o mínimo de recursos para o expectador
descobrir sua identidade.
A direção de Jean Yarbrough segue um rumo bastante convencional, mas coerente com a história que tinha em
mãos. Como curiosidade, nesse mesmo ano de 1946, Yarbrough recebeu uma
enxurrada de criticas de vários setores da mídia especializada, assim
como o próprio estúdio Universal, em virtude do polêmico filme “Casa dos
Horrores”, que contava com Rondo Hatton no papel de um homem de feições
monstruosas e comportamento homicida. A questão é que Hatton era
realmente deformado em virtude de uma rara doença da qual era portador, e
a conservadora sociedade norte-americana achou uma atitude extremamente
antiética e de mau-gosto explorar a imagem de um homem doente e
desfigurado em um papel monstruoso. A polêmica foi tanta que a Universal
acabou vendendo os direitos da franquia protagonizada pelo Creeper,
personagem da Hatton, para o pequeno estúdio PRC, e até hoje essa obra
permanece inédita em DVD.
Mas, curiosidades à parte, a verdade é que “A Mulher-lobo de
Londres” é um filme peculiar, que não guarda maiores similaridades com
nenhum outro do gênero de lobisomens, nem mesmo com aqueles produzidos
pela própria Universal nesse período. A grande sacada dessa obra se
constitui basicamente em conduzir as atenções até o clímax, no final,
onde a identidade da Mulher-lobo é revelada. E se descobrir quem é a
verdadeira vilã pode até não ser muito surpreendente para um expectador
mais atento, o mesmo não se pode dizer sobre uma outra surpresa,
igualmente reservada para o final, e que certamente irá desagradar muita
gente.
Em tempo, uma série de TV também intitulada “A Mulher-lobo de
Londres” foi produzida entre os anos de 1990 e 1991, tendo sido
cancelada após apenas 20 episódios, e que, além do nome, não possui
nenhuma relação com o filme de 1946.
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