Vampira e James Dean: O lado sombrio de Pietá


Publicado originalmente em Vampyrismo.Org

O mais instigante nesta imagem é o título da matéria, James Dean e a "Madona Negra", Madona é um nome italiano para a "Virgem Maria"...Existiu entre o século XI e XII na Europa, o culto as "Madonas Negras" - originalmente deusas da terra e da fertilidade, vestidas posterioremente pela igreja de Nossa Senhora, o que marca também o início do culto a Nossa Senhora no Catolicismo e no Cristianismo.

Nossa Senhora desde 380 D.C era uma deídade menor e coadjuvante e só depois de quase 1000 anos de catolicismo, que foi reconhecida e exaltada. Saindo da história medieval e voltando para a década de 1950, o termo Madona Negra é utilizado nesta matéria folhetinesca para referir-se a "Vamp Maila Nurmi". Eu já comecei algumas palestras com esta velha história dos bastidores da tv da década de 1950 nos Estados Unidos. Também apresento esta historieta de forma mais detalhada no texto A Vampe e na apostila "A Fera Bela, A Bela Fera:A Vamp e o Feminino Deletério".

Maila Nurmi, uma atriz finlandesa inventa uma personagem chamada Vampira, inspirada na personagem dos quadrinhos "Dragon Lady" de "Terry e os Piratas" e em sua antecessora Theda Bara. A personagem de Maila, se tornará uma imagem poderosa a influenciar toda cena fetichista e subculturas jovens posteriores. Uma vampira, selvagem, incontrolável e amoral. Uma Deusa Mãe da escuridão, que servirá até como imagem para Lilith entre apreciadores de temas místicos. E que diferente de Lilly Munster e Mortícia Addams, vampiricas, já lavadinhas de um terror ctônico...

Maila Nurmi e sua personagem apavoraravam e poderiam realmente devorá-lo sem remorso. Como era de se esperar, Vampira tinha um jovem adolescente agonizante como seu assistente e como era mais novinho que ela, sua criação pessoal e aspirante a Adônis ou Tammuz. Era o iniciante James Dean, pouco antes de tornar-se famoso no cinema. Há quem diga que ambos tiveram um envolvimento amoroso, há fontes que dizem que não houve. O que aconteceu na realidade foram entrevistas ambíguas tanto de Maila, quanto de James - que dá a impressão de haver ocorrido algum envolvimento. Logo depois da fama, ele renegou Maila e chamou-a de "farsa".

Dizem que em resposta, durante uma campanha promocional de fotos em um cemitério, ela tirou uma foto e enviou para ele com a sutíl dedicatória de "quisera que estivesse aqui" escrita sobre um túmulo. James Dean morreu alguns dias depois.

Poderíamos partir para o prato sensacionalista de sempre com esta histórieta de folhetim. Adicionar maldições ou mal-olhados e inventar tradições que assegurariam tal fato e coisas do gênero. No entanto, mitologia comparada, re-significação e re-apropriação de símbolos e mitos é muito mais interessante e sábio. Mas para um melhor aproveitamento deste conteúdo solicito ao leitor a prévia leitura de outros textos ao longo deste blog.

Adônis e Afrodite Na obra de Camile Paglia, Personas Sexuais, no decorrer do segundo capítulo tem um trecho interessantíssimo:"(...) O principal discipulo da Grande Mãe e seu filho e amante, o deus agonizante da religião de mistério do Oriente Próximo. Neumann diz de Atis, Adonis, Tamuz e Osiris: "Eles são amados, assassinados, enterrados e pranteados por ela, e depois renascem através dela". A masculinidade e apenas uma sombra posta a rodar no eterno ciclo da mãe natureza. Os deuses meninos são "consortes fálicos da Grande Mãe, zangões que servem a abelha-mestra e são mortos assim que cumpriram seu dever de fecundação" . O amor de mãe sufoca o que abraça. Os deuses agonizantes são "flores delicadas, simbolizadas nos mitos como anêmonas, narcisos, jacintos ou violetas".

Tammuz "Os jovens, que personificam a primavera, pertencem a Grande Mãe. São seus escravos, suas propriedades, porque são os filhos que ela teve. Consequentemente, os ministros e sacerdotes escolhidos da Deusa Mãe são eunucos [...] Para ela, amar, morrer e ser emasculado é a mesma coisa". "A masculinidade flui da Grande Mãe como um aspecto dela própria, e é chamada e cancelada por ela à vontade. O filho dela é um servo de seu culto. Nao há como ir além dela. A maternidade envolve a existência.(...)" O jovem Adônis é o personagem principal de um destes mitos.Ele nasce de um incesto, uma vingança Afrodite, para com alguns mortais. O jove é um dos mais belos humanos já nascidos...Afrodite pedirá a Perséphone cuidar dele enquanto cirança, mas ela também se apaixonará por ele - e sua paixão não consumada é que abrirá as portas para encontrar seu Hades, mas está é história para outro dia.

Adônis vai crescer e ganhar os amores de Afrodite.O que irritará sevéramente Ares, o deus da Guerra amante mais antigo de Afrodite.Como sacanagem, ele irá inspirar no jovem, a sede pela adrenalina e a caçada.Para após algum tempo, acabar com a vida do jovem - durante uma caçada.

Afrodite cochilava após uma tarde de amor com Adônis e não pode salva-lo do destino armado por Ares. Adônis irá morrer e a tristeza de Afrodite trará o inverno sobre a terra.A primavera só retorna, quando passa o luto de Afrodite pela perda de seu amante...ela se anima quando vê as flores que eles brincavam nascendo novamente...

Em The Golden Bough, traduzido como "O Ramo de Ouro" de Frazer veremos uma analogia pouco comentada, sobre a analogia entre Jesus e os Deuses Agonizantes.Neste trecho é apresentado o ritual cristão de morte e redenção, claramente como uma apropriação e sobrevivência das antigas religiões de mistérios pagãos.Foi uma gratificante surpresa vêr também esta citação na obra de Camile Paglia, reproduzida abaixo:

"Diz Frazer: "O tipo, criado por artistas gregos, da deusa dolorosa com o amante morrendo em seus braços, assemelha-se e pode ter sido o modelo da Pietá da arte cristã ". Os primeiros Cristos cristãos e bizantinos eram viris, mas assim que a Igreja se estabeleceu em Roma, o paganismo romano residual tomou conta. Cristo recaiu no Adonis. A Pietá de Michelangelo é uma das obras de arte mais populares do mundo em parte por sua evocação da arquetípica relação com a mãe. Maria, com seu rosto de virgem imaculada, e a Deusa Mãe sempre jovem e sempre virgem. Jesus é admiravelmente epiceno, com mãos aristocráticas e pés de mórbida delicadeza. O agonizante deus andrógino de Michelangelo funde sexo e religião a maneira pagã.

Chorando em seus mantos opressivos, Maria admira a beleza sensual do filho que ela fez. Os vítreos membros escorregando para baixo no colo dela, Adonis afunda de volta a terra, a força esgotada pela mãe imortal e a ela devolvida. Freud diz: "É destino de todos nós, talvez, dirigir nosso primeiro impulso sexual para nossa mãe". 0 incesto esta no inicio de toda biografia e cosmogonia. O homem que encontrou sua verdadeira esposa, encontrou sua mãe. O domínio masculino no casamento é uma ilusão social, alimentada por mulheres que exortam suas criações a brincar de andar. No núcleo emocional de todo casamento ha uma pietá de mãe e filho. Vou encontrar vestígios do incesto arcaico dos cultos da mãe em Poe, James, e em De repente no ultimo verão (Suddenly last summer), de Tennessee Williams, onde uma mãe rainha, reinando sobre um brutal jardim primevo, dá em casamento seu filho esteta e homossexual, o qual é ritualmente assassinado e pranteado. O dinamismo feminino e a lei da natureza. A terra desposa a si mesma.

Uma inversão da Pietá Clássica, no entanto os vampiros de Anne Rice não tinham persona masculina ou feminina rígida...heheheh...A ironia do filme Entrevista com o Vampiro, para com esta re-leitura de Pietá, talvez seja que no século XIX, a sociedade e o homem houvessem roubado o papel de limitador e devorador do feminino e do Ecossistema...um dia aprofundo esta parte...

A mulher fatal mais experiente e o jovem que encontrará a morte depois da servidão e incapacidade de penetra-la, é um tema recorrente na produção cultural do ocidente.Nos filmes mudos, o jovem as vezes era um adulto na casa dos trinta anos - vitima da "Vamp" Theda Bara. Nos filmes vampíricos europeus, dos anos sessenta e setenta esta será uma temática comum, acompanhada de cores e ângulos de camêras que até hoje são aulas de fotografia no cinema. A vampira como a face da Deusa-Mãe mais sombria...o turbulento e destrutivo ecossistema...

Embora estranha a imagem, ela oferece uma visão e uma saída do dilema. No entanto, não desejo encerrar este texto, sem oferecer uma resposta ou uma saída ao dilema, que todos se perguntam - sobre o como sobreviver ou como sair da tal situação e se nos mitos da antiguidade haveriam alguém ou algo que controlasse tal devoradora.

A resposta é, sim, existe. O mito se encontra na Roma Imperial, e discretamente disfarçado e despercebido em todos os nossos calendários modernos.Despeço-me do leitor com um trecho do texto "Jano e Jana" de Gwydion Drake, publicado no Tribos de Gaia:

"(...)Jano era representado com uma cabeça bifronte (com dois rostos), um jovem e imberbe olhando para frente, podendo ver o futuro, e outro mais adulto e barbado olhando para trás, vendo o passado. Era considerado nos documentos que persistem no tempo como o Deus das Portas e dos Inícios, mas provavelmente nos antigos cultos latinos e/ou etruscos ele representava mais que isto.

Sendo o presente, que contempla o passado e o futuro, podemos considera-lo como um senhor do tempo, como o Chronos grego, ou ainda mais, já que ele era o deus das portas e das chaves, ou seja, tinha também o poder de abrir e fechar as portas da eternidade. Contemplando o mundo a partir de todas as perspectivas, visualizando a totalidade, sem nenhuma dualidade. Para Jano, não existia o bem e o mal, o branco e o negro, luz e trevas.

Tudo era assimilado e compreendido por ele. Apenas um deus com estas as características poderia ser capaz de penetrar, compreender e dar sentido à natureza criada por Jana, a Deusa Mãe adorada nos cultos ancestrais, através de mil nomes. Jana, Iana, Djana, Diana e com todas as variações possíveis da Raiz indo-européia “Dan” Don, Danan, e outras tantas, neste contexto, cuidava amorosamente de tudo que vivia e crescia no mundo.

Jana incorporava a ordem universal, desde o seu domínio sagrado da realidade temporal, da sacralidade cíclica à transcendência. Nela tudo se fundia e os contrários se encontravam criando o sentido do absoluto. Mesmo o posterior cristianismo adota Santa Ana, a mãe da virgem Maria, mãe de Deus, deixando claro que Jana, acompanhada de Jano, permanece absoluta como a grande Deusa Mãe universal. Jano controlava a vida que Jana criava e nutria.

Estas eram as portas que se abriam e se fechavam, transformando em presente o passado e o futuro, que só existem para quem não crê na totalidade da vida. Como os ciclos do carvalho, que aparentemente morre e perde suas folhas, para renascer de si mesmo, representando a renovação de todo o universo representado por Jana e sua imagem perene do azevinho, que nunca perde suas folhas. Ambos, enquanto simbolizavam a união dos contrários, eram na realidade uma coisa só: uma idéia superior que rompe com todos os padrões estabelecidos pelas aparências, eram uma unidade e marcavam a quebra de todas as falsas realidades e limites da vida.(...)" .

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