David
Paul Cronenberg nasceu em 15 de março de 1943 em Toronto, Ontário,
Canadá. Membro de uma família tradicionalmente judia, Cronenberg fez
faculdade na Universidade de Toronto e formou-se em Literatura antes de
lançar-se ao mundo dos filmes em 1969 com Stereo. Durante os anos 1970 o governo canadense financiou seus projetos em parceria com Ivan Reitman, do qual o auge é Shivers
(1975). Os anos 1980 trouxeram algumas novas empreitadas na vida do
diretor que pode experimentar o anbiente dos filmes classe A ao filmar Na Hora da Zona Morta (1983) e A Mosca (1986).
Os anos 1990 não foram de grande produtividade e teve boa parte
concentrada em participações como ator ou apenas roteirista, sendo que o
único filme a ter toda sua atenção, Crash (1995)
ganhou diversos prêmios. Nos anos 2000 Cronenberg fez uma aparição em
Jason X (2002) para delírio dos seus fãs e foi eleito o décimo sétimo
entre os 40 melhores diretores de todos os tempos.Desde o início de sua carreira até hoje, só filmou uma única coisa: as transformações do pathos. Seu interesse parece estar unicamente voltado para as mudanças que o corpo sofre quando submetido a determinados procedimentos, mentais ou físicos. O corpo como terreno de experimentações, como submetido aos efeitos do tempo, dos vícios e das pulsões. Mais que em qualquer outro cineasta contemporâneo, Cronenberg reúne definitivamente o que não era para ser separado: corpo e alma são um único ser, entregue sem piedade à mudança imposta pela duração. Fazer um corpo no cinema, tarefa difícil.
Como na literatura, o corpo humano só pode existir no cinema se torcido, deslocado, situado no tempo e no devir. Um corpo, para aparecer, deve ser colocado em relação com aquilo que não é ele, para só então poder mostrar sua real existência, já devidamente modificado. Nos filmes de Cronenberg, um corpo sempre está submetido a um fora que interfere nele, que faz o papel do tempo modificador, que transforma finalmente o corpo em matéria cinematográfica, num bocado de carne que sofre. Esse fora é o lugar do vício. O corpo se apega as coisas, e se apega sistematicamente. É próprio dele submeter-se cegamente às injunções da realidade externa, do "mundo das coisas". Aquilo que está fora do corpo molda o corpo, redefine-o a partir das experiências que um tem com outro.
Jamais uma operação de solipsismo, onde um espírito, em sua interioridade, agiria sobre um mundo passivo; jamais também um mundo predestinado, onde o corpo seria joguete, simples atualização de uma situação já dada. Corpo e vício operam uma ação entre-dois. O vício é sempre mais forte, mas simplesmente porque o homem é mortal. Não há propriamente pessimismo nos filmes de Cronenberg. O que há são as regras de um programa: o corpo está imerso num mundo; logo, está sujeito às variações; essas variações incitam o corpo a ultrapassar os seus limites, rompê-los, levá-los até seu ponto máximo para depois finalmente padecer. O padecer jamais é índice de um final infeliz, mas simplesmente a etapa final de um processo, de um programa de experimentação que o corpo desenvolve com aquilo que lhe é exterior.
Daí surgir uma coisa como um personagem cronenberguiano — vítima das situações, mas eternamente curioso para saber qual será o próximo passo a que o pathos vai conduzi-lo. Os personagens de Cronenberg têm todos uma placidez no olhar, uma curiosidade associada sempre a uma espera pela próxima etapa. Jeremy Irons, James Woods e James Spader talvez sejam os melhores exemplos do trabalho de Cronenberg: atores que têm um modo de interpretar muito diverso, mas que no mundo cronenberguiano estão muito parecidos, com a mesma frieza, contenção de gestos e o olhar afundado, como se estivessem olhando nunca para a frente, mas para trás ou para além do horizonte. A obra de Cronenberg num momento muda de tom. A partir de "Dead Ringers", todo o horror do vício e do pathos, as principais transformações que ocorrem não mais se dão na tela, à frente do espectador.
Depois de "Dead Ringers", mesmo que haja muita transformação física e figuras esquisitas (os mugwumps de Naked Lunch, por exemplo), é antes uma inquietação mental que fustiga os personagens e faz seguir o relato. Nessa nova fase, o gosto pelo grotesco, pela gosma, pela deformação corporal é submetida à intensidade intelectual ou, antes, caminha de mãos dadas com ela. Com "Dead Ringers", a obra de Cronenberg atinge a maturidade e todas as suas características dilapidadas. O estilo se purifica; a encenação e as propostas dão um passo para o classicismo enquanto o sentido dos filmes passa a apresentar significações mais intensivas, como um literato que, para subverter a literatura, prefere utilizar a escrita mais límpida e direta.
Um movimento de câmara resume bem o trabalho de David Cronenberg: um lento traveling lateral diante de uma batida de carro, em "Crash". Toda a placidez misturada com beleza que vemos nos personagens aí aparece com a câmara, olhando inutilmente para o ocorrido, movimentando-se sem pressa e deixando-se nutrir pelo que está em volta. O corpo como laboratório, o desejo como único juiz, o tempo como sentença: poucas vezes o cinema pôde ver autor tão libertário como este diretor. Cronenberg planeja lançar mais 4 filmes entre 2011 e 2013 e uma mostra sobre seu trabalho pode ser vista em São Paulo até o dia 02 de outubro.
Filmografia
- 2007 - Senhores do Crime (Eastern Promises)
- 2005 - Marcas da Violência (A History of Violence)
- 2002 - Spider - Desafie sua Mente (Spider)
- 2000 - Camera
- 1999 - eXistenZ (eXistenZ)
- 1996 - Crash - Estranhos Prazeres (Crash (1996))
- 1993 - M. Butterfly (M. Butterfly)
- 1991 - Mistérios e Paixões (Naked Lunch)
- 1988 - Gêmeos - Mórbida Semelhança (Dead Ringers)
- 1986 - A Mosca (The Fly)
- 1983 - Na Hora da Zona Morta (The Dead Zone (filme))
- 1983 - Videodrome - A Síndrome do Vídeo (Videodrome)
- 1981 - Scanners, sua mente pode destruir (Scanners)
- 1979 - Filhos do Medo (Brood, The)
- 1979 - Fast Company
- 1977 - Enraivecida na Fúria do Sexo (Rabid)
- 1975 - Calafrios (Shivers)
- 1972 - Don Valley (TV)
- 1972 - Fort York (TV)
- 1972 - In the dirt (TV)
- 1972 - Lakeshore (TV)
- 1972 - Scarborough bluffs (TV)
- 1972 - Winter garden (TV)
- 1971 - Jim Ritchie sculptor (TV)
- 1971 - Letter from Michelangelo (TV)
- 1971 - Tourettes (TV)
- 1970 - Crimes of the future
- 1969 - Stereo
- 1967 - From the drain
- 1966 - Transfer





































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