
“Aquele que profana as tumbas sagradas do Egito, morre!” – Palavras
proféticas pronunciadas há mais de 4.000 anos pelo grande sacerdote de
Karnak, durante o sepultamento da bela princesa Ananka.
A base fundamental de todas as minhas argumentações sobre este
artigo tem inexoravelmente como pano de fundo, o espectro da morte, e
desta forma nossa investigação irá abranger os obscuros e sinistros
caminhos que nos levam a conhecer, pelo menos teoricamente, como o
“fenômeno de morrer” foi absorvido em todas as culturas primitivas
culminando na pedra de alicerce fundamental da religião e do culto
cerimonial.
Parece que a “morte” é a base de tudo, de toda a necessidade de
religar-se aos Deuses, o medo da morte foi ao meu ver, o impulso mais
forte que impeliu os homens primitivos a levantar seus primeiros
monumentos funerários sobre a forma sagrada de altares e assim nascia o
culto aos mortos...
Neste estágio da evolução humana os homens passaram a
ornamentar o sepulcro dos seus mortos e as sepulturas foram os primeiros
altares de adoração de que se tem registro, assim o morto tornava-se
uma espécie de semi-deus, sendo cultuado por seus parentes ou familiares
ainda vivos.
O que é espantoso na antiguidade do homem são os registros
arqueológicos no que diz respeito às suas próprias origens. Existem
vestígios de quatro milhões de anos onde um ser primitivo deixou a marca
de suas pegadas sobre o solo que depois de coberto por cinza vulcânica,
petrificou-se e isto ocorreu em Laetoli, na Tanzânia, continente
africano. Outra descoberta de fóssil primitivo, também em solo africano,
data de cerca de três milhões de anos, e os arqueólogos chamaram-na de
“Lucy”, a australopiteco etiópica. Além de outras descobertas que vem
surpreendendo a todos nós, contemporâneos, religando o elo perdido do
passado do gênero humano à atualidade.
Parece que o tempo é o grande abismo que separa-nos de nossos
antepassados primevos, mas não somente esta ampulheta enorme com areia
fina do deserto caindo, mas ainda a própria evolução e transformação são
bastante relevantes. Mas o que é assustador é que mesmo com o passar de
milhões de anos, o espectro da morte perseguiu os passos de todos os
homens, ou melhor, de todas as criaturas viventes! Mas este processo
natural de transformação encontrou dentro das primeiras civilizações uma
espécie de culto supremo, pois sendo a morte a única certeza e verdade
na vida, passou a ser encarada pelos homens como algo que
verdadeiramente deve ser tomado a sério culminando de túmulos simples a
enormes pirâmides.
Dentre os grandes impérios e civilizações do passado remoto, o
Egito antigo é o que mais me fascina, confesso! Acredito que não sou o
único, pois a rica e vasta cultura egípcia chegou a causar inveja entre
gregos, romanos, ingleses, franceses, entre outros. Tudo no Egito antigo
é belo! Grandioso! Feito para durar por toda a eternidade. Tudo foi
calculado com um apurado grau de precisão matemática quase que absoluta.
Para durar para sempre. É o caso dos templos e palácios egípcios, além
das famosas pirâmides gigantescas!
O Imperador Napoleão Bonaparte, certa vez exclamou aos seus soldados antes da “batalha das pirâmides”, a seguinte frase:
“Soldados, do alto destas pirâmides quarenta séculos vos contemplam”.
Parece que o Egito com todo o encanto místico que possui,
impregnou o imperador com um “ardor contemplativo” profundo! Durante a
ocupação das tropas napoleônicas no Egito, uma organizada comissão de
cientistas, escritores, pintores e historiadores mantiveram-se ocupados
de maneira intensiva mergulhados no estudo dos segredos do Egito.
Estudaram pássaros e gatos mumificados, pesquisaram os ritmos musicais e
as danças egípcias, traçaram mapas, exploraram as ruínas antigas, e
uma das mais importantes descobertas dessa campanha militar foi o
encontro da preciosíssima Pedra Roseta, uma espécie de laje basáltica
com inscrições gravadas em hieróglifos, demóticos e grego. E a partir
desta descoberta facilitou-se o trabalho de decifrar os misteriosos
signos egípcios. A empreitada do nobre trabalho ficou sob os auspícios
de Jean François Champollion e de Thomas Young, e assim estava dado um
grande passo para o estudo e compreensão deste enigmático alfabeto da
antiguidade.
A equipe ainda descobriu várias múmias de seres humanos e
Napoleão inspecionou todos os achados arqueológicos, pois sabia da
importância da cultura egípcia e muito se interessava pelo Egito. Mas
nem tudo é glória e existem alguns boatos, que foram alguns soldados de
Napoleão, os responsáveis pelo nariz quebrado de uma das esfinges do
Egito, usando esta como “tiro ao alvo”..., coisas que ouvimos falar por
aí...
Os egípcios antigos adoravam vários deuses e a religião tinha
um aspecto bastante importante para esse povo, era enorme a crença no
sobrenatural e este aspecto básico impregnou de lenda e maldição todas
as câmaras mortuárias dos seus finados. Parece que os egípcios viviam em
função da preparação para a morte. Morrer era a passagem para a
eternidade, morrer era o único fim objetivo desta vida, morrer era ainda
o ponto máximo da própria existência!

O lado mórbido desta sinistra civilização, a mumificação...
Aqui começa a preparação do corpo do morto para encarar sozinho seu
destino de sombras, a própria eternidade, em um local chamado de “a casa
da morte”. O corpo era levado, ali sob a luz de Círios, lamparinas de
óleo ou mesmo tochas fumegantes. Iniciava-se então o processo de
mumificação. O corpo do morto era colocado sobre uma laje de mármore em
formato de mesa, despido de suas vestes, completamento nu, exatamente
como é feito hoje nas salas de autópsias dos necrotérios dos hospitais
das grandes cidades, com a diferença de que o ofício era feito por
sacerdotes e nunca por “auxiliares leigos”, que cortam o corpo do morto
sem o menor respeito, escarnecendo assim a imagem do miserável, ali na
“casa da morte”. O falecido, que em muitos casos era nobre, era
respeitado com profunda devoção religiosa. Um dos primeiros passos era
extrair os miolos do cérebro e isto era feito com uma técnica precisa,
usavam ganchos de aço que introduziam pelas fossas nasais. Desta forma,
boa parte do cérebro era extirpada para fora da caixa craniana. O que
sobrava era extraído com infusão de drogas. E hipótese alguma abriam o
crânio de maneira tão grosseira como se fazem hoje nos “IML da vida”!
Dado o primeiro passo da mumificação, a extração do cérebro
pelo nariz, seguia-se o segundo passo do sinistro ritual, removendo as
vísceras através da incisão no abdômen ou flanco esquerdo, depois
lavavam toda a cavidade do interior do corpo com perfumes, ervas
aromáticas e vinho. Os órgãos extraídos, coração, pulmões, eram
guardados em vasos especiais próprios para esta finalidade, denominados
“vasos canopos”. Os órgãos eram untados com resina ou parafina
derretida.
O terceiro passo da mumificação era mergulhar o corpo numa
solução de natrão para curtir por um espaço de tempo que variava de 40 a
70 dias, de acordo com a técnica empregada e o pagamento do serviço
prestado. Assim o corpo ficava desidratado e seco. O próximo passo era
preencher as partes “ocas” do corpo com areia, argila, pedras preciosas,
pó de serragem, resinas especiais aromáticas, camafeus preciosos, e até
pergamihos com oráculos inscritos para ajudar o morto na hora do seu
julgamento. Depois, seguia-se o próximo passo, onde outras partes do
corpo eram preenchidas com panos ou estopas ensopadas em óleos
perfumados, resina com mirra e canela e mais serragem.
Seguindo o ritual de mumificação típico do antigo Egito,
fazia-se a unção do corpo com outros unguentos e depois tratava das
superfícies externas do corpo com mais resina derretida. Na sequência
vinha um dos sacerdotes com extensas faixas de linho para enrrolar o
corpo todo do morto com várias tiras, de modo que todo o corpo fique
coberto com as tiras de linho. Também neste procedimento, amuletos
sagrados e jóias preciosas eram escondidas pelo corpo todo da múmia. Em
alguns casos, dava-se por último o banho de betume da Judéia, e então a
múmia estava pronta para ser sepultada com dignidade típica da nobreza
faraônica do antigo Egito!
O sarcófago ou caixão das múmias também eram preparados de
maneira especial e a maior parte do material de studo do antigo Egito
encontrado pelos arqueólogos está diretamente ligado aos túmulos dos
mortos...
Em muitos casos estes sarcófagos eram entalhados na pedra bruta
e em outros casos em madeira de lei. O próprio pronunciar da palavra
“sarcófago” produz de imediato uma atmosfera mórbida de um sinistro
horror. Tem nesta palavra a presença imediata da morte como um horrível
espectro de pestilento terror... A impressão que se tem é que um
sarcófago é algo mais lúgubre que um simples caixão! Eu mesmo pude
comprovar esta experiência estranha quando visitei o museu de história,
arqueologia e antropologia da USP. Ao ver de perto a tampa de um
sarcófago original entalhado em madeira, é uma experiência muito
complexa para traduzir em palavras, produzindo em cada indivíduo uma
reação diferente de acordo com a personalidade de cada um. No meu caso,
confesso que fiquei muito impressionado...
O sarcófago de uma múmia é uma preciosidade de valor
incalculável, devido não somente por seu valor histórico, mas artístico
também. O lado interno do mesmo, em muitos casos tem o formato do corpo
humano, onde a múmia era deixada com as mãos cruzadas sobre o peito.
Em alguns sarcófagos ou caixões do antigo Egito, sobre a sua
parte exterior, muitas vezes tinha-se a decoração dos capítulos do
famoso livro dos mortos. Este, que continha orações, feitiços,
encantamentos e evocações para os deuses com o intuito de transportar o
“novo viajante” para o além... Não é de se espantar que as múmias
tenham sido nos últimos tempos um tema ideal para filmes de terror,
afinal toda esta realidade já dá uma cena inédita e bem ilustrada. Como
se não bastasse todo este ritual de mumificação, o sarcófago era
transportado para a câmara funerária do interior de uma gigantesca
pirâmide que também tinha sido construída exclusivamente para esta
finalidade! Uma espécie de monumento funerário de enormes proporções com
o objetivo específico de túmulo perpétuo...
Segundo Jean Pierre Bayard, autor do livro “Sentido oculto dos
ritos mortuários”, por mumificação devem-se entender, todos os processos
naturais e artificiais empregados na conservação do corpo ou de uma
parte dele.
Para os egípcios, a conservação do corpo era fundamental para
que quando ocorresse a “ressurreição”, a alma do finado voltasse a
habitar o corpo do qual havia abandonado. Parece que a “esperançada vida
eterna” não é uma manifestação somente da cultura e religião cristã.
Muito antes de Cristo, os homens já tinham a eternidade como o
verdadeiro alvo.
Por falar em Cristo, vou citar uma passagem bastante
significativa e com um fundo filosófico profundo em se tratando de
múmias, ressurreição e morte. Segundo o novo testamento, Cristo
ressuscitou um morto de nome Lázaro. Tomemos a escritura para uma
análise, em seus fragmentos mais significativos: “Estava
enfermo Lázaro, de Betânia, da aldeia de Maria e Marta. A notícia
chegou aos ouvidos de Jesus, mas este ainda se demorou dois dias no
lugar onde estava. Lázaro viera a morrer e logo estando este já
sepultado, haviam se passado quatro dias...”. Aqui
parece que os judeus mantiveram uma tradição quase igual à dos egípcios,
lavavam o cadáver com muito cuidado, por tratar-se de lepra e ataram
todos os membros com faixas, perfumando com mirra e pó de alóes, depois
recobriram o corpo morto com um lençol branco e o sepultaram em uma
pequena caverna, lacrando a entrada com uma enorme pedra... “Chegando
Jesus no local do sepulcro, exclamou: Tirai a pedra, Lázaro não está
morto. Outros lhe diziam: Mas já faz quatro dias que ele morreu e já
cheira mal! Jesus disse: Lázaro, sai do sepulcro, vem para fora! E saiu
aquele que estivera morto, tendo os pés e as mãos ligadas com ataduras e
o rosto envolto num lenço... Disse Jesus: Desatai-o e deixai-o ir...”
É bastante surpreendente esta passagem, pois do sono da morte, o
morto foi tirado, voltando à vida como que por uma força sobrenatural
quase inacreditável, mas bastante significativa. Esta passagem da
escritura do novo testamento pode ser estudada por completo em “João,
capítulo II, versículos 1 a 46”. A idéia de ressurreição encontrou nesta
escritura, o sentido mais profundo da palavra...
Dentro do mesmo assunto, o genial Emile Zola aprofundou-se em
uma reflexão sobre a “ressurreição de Lázaro” e escreveu as seguintes
palavras com profundo senso de realidade filosófica: “Muitas
vezes imaginou Lázaro a sair do túmulo e a dizer a Jesus: Senhor, para
que me chamastes de novo a esta vida abominável? Estava a dormir tão bem
o eterno sono profundo, saboreava um repouso tão bom, nas delícias do
nada! Conheci todas as misérias e todas as dores, as traições e
esperanças falsas, as derrotas, as doenças, tinha pago ao sofrimento a
minha horrível dívida de vivente, porque nasci sem saber por quê e vivi
sem saber como, e vós, senhor, pedis-me dobrado preço condenando-me a
recomeçar o meu tempo de degrêdo!... Cometi eu falta sem expiação, visto
que a punis com tão cruel castigo? Tornar a viver, Deus do céu! Sentir a
gente cada dia a carne morrer, não ter inteligência senão para duvidar,
não ter vontade senão para nada poder, não ter sentimentos senão para
chorar as suas penas! E estava tudo dito, acabava de transpor o limiar
terrificante da morte, o momento que envenena a existência inteira já
tinha sentido o suor da agonia molhar-me a face, o sangue retirar-se dos
membros, o fôlego faltar-me e ir-se embora com um derradeiro soluço.
Este horror, quereis vós, senhor, que o conheça duas vezes e que minha
miséria exceda a de todos os homens!... Senhor, fazei que seja já! Meu
Deus, fazei este outro grande milagre! Tornai a lançar-me no túmulo!
Tornai a mergulhar-me sem que eu sofra no meu sono eterno interrompido!
Por piedade não me inflijais o tormento de voltar à vida, o tormento
medonho a que não ousastes ainda condenar ninguém. Sempre vos amei e
servi, não façais de mim o maior exemplo de vossa cólera, que iria
lançar o espanto nas gerações. Sede bom e meigo, senhor, restitui-me o
sono que bem mereço e tornai a adormecer-me nas delícias do nada!”
Parece que aqui, o horror profundo foi mais forte e intenso no
próprio morto que retomou à vida do que naqueles que viram-no
ressuscitar por um sopro sobrenatural!
A lenda de Kharis do antigo Egito, a também chamada de múmia
viva, esta possui um horror profundo por envolver não somente a tragédia
em si, mas também o amor perdido e a condenação da bela Ananka, a mais
bela das belas, princesa formosa onde guardas debaixo do véu sagrado o
mais lindo rosto de mulher. Contemplei tua beleza e agora estou cego!
Eu, o prícipe Kharis, cego de paixão por beleza tão sublime... O amor de
Kharis por Ananka foi tão forte que os seus diálogos ardentes foram
registrados em antigos papiros egípcios, mas a tragédia se abateu sobre
os dois enamorados, e um dia, talvez o mais negro para Kharis, sua bela
amada morreu. Sua morte amargou profundamente sua alma apaixonada.
Ananka, a bela Ananka estava morta... Seu corpo foi levado para a “casa
da morte”. Ali, sob à luz de tochas funerárias, prepararam o ritual da
princesa para a vida eterna, mumificando seu lindo corpo... Repleta de
camafeus e pedras preciosas, perfumada com incensos e aromas orientais, a
princesa Ananka fora enrrolada em extensas faixas de linho branco...
Sua múmia fora levada para uma tumba subterrânea e junto dela, sobre o
altar de amonha, o deus dos mortos e Anúbis, o deus com a cabeça de
chacal ou cão preto, diretamente ligado à necrópole e ao enigmático
processo de mumificação. Ali foi também deixado o pergaminho sagrado
contendo as evocações de Isis à Osiris, para a ressurreição dos mortos.
Neste papiro de valor incalculável, intocável por qualquer mortal comum,
a não ser pelo sumo sacerdote preparado para tal, todo aquele que
profanasse a tumba e evocasse aquelas palavras, teria o poder de
ressuscitar os mortos!



Kharis, no desespero da sua dor profunda, guiado talvez por um
poder de força maior, o amor, conseguiu dentro da escuridão da
madrugada, passar pelos guardas que vigiavam a tumba de Ananka... Então,
Kharis fora direto aos pés do deus Amonha, tomou o papiro sagrado e num
impulso que ele mesmo desconhecia, pronunciou desesperadamente em voz
alta a evocação ali contida para que através deste esforço, os deuses
egípcios ressuscitassem a bela Ananka! Aqui está o fragmento contido no
papiro traduzido:
Pergaminho de Toth:
“Oh! Amon Ra, Deus
dos Deuses! A morte é apenas a entrada para uma nova vida. Vivemos hoje e
viveremos de novo, retornaremos sob muitas formas, oh todo poderoso!”
Parece que foram estas as palavras mágicas com as quais Ísis
ressuscitou Osíris. Este pequeno fragmento foi extraído do primeiro
filme da múmia, lançado em 1932, estrelado pelo genial Boris Karloff, e
produzido pela Universal Films.
Mas não bastou a fatalidade da morte de Ananka para escarnecer
Kharis. Os soldados e alguns sacerdotes que haviam preparado todos os
ritos funerários descobriram que alguém profanou o túmulo. Era Kharis...
Kharis foi preso e imediatamente coberto pela maldição! Profanou os
túmulos sagrados e agora irá morrer de uma maneira bastante cruel...
Introduziram um gancho especial feito com a exclusiva finalidade de
puxar a língua de dentro da boca para fora, e cortaram-na num só golpe
com lâmina afiada. Afinal, ele havia pronunciado em voz alta palavras
sagradas e proibidas por mortais comuns... Depois, condenaram-no a ser
sepultado vivo, enfaixaram seu corpo com faixas de linho branco usadas
para o delicasdo trabalho de mumificação e o trancaram num sarcófago...
Ainda em vida, respirando e em estado de consciência plena, Kharis viu
diante de si o sinistro reino da morte envolto em escuridão absoluta. E
na tentativa de ressuscitar a sua bela Ananka, ele acaba juntando-se à
ela como na famosíssima peça de Shakespeare, intitulada “Romeu e
Julieta”, onde no final, ambos os jovens dormem o mesmo sono de finados!
Parece mesmo muito trágico! Os senhores não acham? Mas foi em cima
desta história macabra que o cinema criou um bem apresentado enredo para
fazer da múmia um novo monstro de horror, depois de Drácula e da
criatura de Frankenstein.
Mas que coisa estranha, há uma sinistra ligação e uma causa
comum em todos estes monstros. Drácula vive pela eternidade a fora,
enquanto beber sangue fresco. O monstro de Frankenstein fora criado com
restos de pedaços de corpos mortos, e a vida voltou a soprar no novo
corpo através de um raio elétrico. E a múmia voltou à vida depois de uma
evocação sobrenatural. Tudo transcende a morte, tudo criado e
transformado para o além da morte. Então é provável que a ressurreição
seja mesmo algo muito mais medonho que o simples morrer em si...
Se não me falha a memória, em meados do ano de 1976, mais ou
menos, passava na TV exatamente às 23 horas de sábado, a “sessão
maldita” intitulada Cine Mistério. Bons tempos eram aqueles, e
eu ainda um menino, deparava-me com minhas primeiras imagens de filmes
de terror! Minha querida mãe proibia-me de assistir os mesmos, afinal
eram cenas muito fortes para uma criança assistir. Então, eu e minha
irmã mais velha davámos um jeitinho e assistíamos escondidos. Foi neste
tempo que vi pela primeira vez um filme sobre múmias! É lógico, eram os
clássicos A Múmia (1932) ou A Praga da Múmia (1944),
com Lon Chaney. Desta forma, considerei verdadeiramente este mito de
terror e através de uma imagem de cinema, antes mesmo de eu aprender a
ler e consultar livros, já tinha então uma idéia sobre o que seria o
“antigo Egito”...
No caso dos filmes de terror sobre a múmia, todos os enredos
das histórias foram criados especialmente para o cinema. Parece que não
saiu das linhas dos grandes livros de literatura, apesar do fundo que
ilustram as obras com evocações e cenas que relembram os ritos
mortuários do antigo Egito sejam evidentes.
A dramaticidade de um dos primeiros filmes sobre a múmia, em
1932, com o papel principal dado ao grande Boris Karloff, que parece
mesmo ter nascido para fazer filmes de terror, é incrível, se meditarmos
um pouco... Parece que o monstro de Frankenstein (também magistralmente
interpretado por Karloff em 31) e a múmia encontraram no talento do
ator, toda a expressão trágica que carregam em si mesmos!
A história do filme passava no deserto de Núbia, uma espécie de
sítio arqueológico onde os pesquisadores faziam escavações e
encontraram o túmulo da múmia com as relíquias do antigo Egito e a caixa
contendo o papiro sagrado. É o início desta aventura pelos caminhos do
desconhecido. Estes pesquisadores, financiados talvez pelo museu
britânico, em expedição no ano de 1921, discutiam sobre o achado
misterioso. A múmia encontrada pelos mesmos parecia ter sido de um
condenado, que por sacrilégio fora enfaixado vivo e colocado dentro do
sarcófago. Parece que sua morte foi bem desagradável, foi enterrado
vivo...
Em uma das extremidades do sarcófago, as ditas palavras
sagradas ou mágicas contendo orações do antigo livro dos mortos, com o
objetivo de proteger o morto na outra vida, foram tiradas como parte do
horrível castigo. Assim, parece que aquela múmia carregava consigo uma
maldição muito forte pela eternidade afora. Junto do sarcófago, uma
enorme arca de madeira que guardava uma outra menor que parecia ser de
algum metal, ouro para ser mais exato! Mas antes mesmo dos arqueólogos
abrirem a arca, uma terrível maldição escrita em hieróglifo alertava:
“Morte – punição eterna para qualquer um que abrir este ataúde, em nome de Amonha, o Rei dos Deuses!”
Ao decifrarem esta terrível maldição, hesitaram com prudência e
não ousaram abrir... Os dois arqueólogos mais velhos discutem entre si,
o abrir ou não abrir a enigmática arca, deixando um auxiliar, o mais
jovem, sozinho na sala onde se encontrava o sarcófago da múmia, a arca
de ouro contendo algo muito curioso... Que tipo de surpresa poderá
conter dentro de uma arca mortuária lacrada há 3700 anos
aproximadamente? Esta curiosidade levou o infeliz jovem a desafiar a
maldição... A imprudência e a ousadia moram na juventude, por isso que
vemos sempre a morte prematura de muitos mancebos... Com aquele
indivíduo foi a mesma coisa! Aproveitou a oportunidade e abriu a arca de
ouro, contendo o papiro sagrado de evocação dos mortos, impulsionado
pela curiosidade do desconhecido, invocou os mortos ao pronunciar os
escritos. Para seu horror, atrás de si, a múmia voltava à vida, depois
de mais de 3700 anos de sono profundo...
A cena da ressurreição da múmia lembrou-me um verso de Dante, extraído da “Divina Comédia”: “Deste profundo sono fui tirado, por hórrido estampido estremecendo, como quem por força é despertado...”
Então, de repente, o choque! O jovem depara-se com a múmia
viva, que imediatamente vai arrastando-se como medonho monstro do além. O
jovem enlouquecido gargalha... mas sua imediata loucura já é o
cumprimento da maldição! Mais tarde tem-se a notícia da sua horrível
morte: “Um jovem completamente doido, enlouquecido, morre na aventura de uma expedição arqueológica...”
Particularmente, não tenho muito o costume de fazer a narração
de um filme todo, pois dá-se a impressão que já não há mais o que se ver
depois de “denunciadas” as melhores cenas, por isso quero reservar-me
ao comentar sobre os filmes de múmias, ocultando as melhores cenas para
que aqueles que ainda não assistiram, quando assim o fizerem, possam
mergulhar no ainda desconhecido enredo de horror sem saber previamente
as magníficas surpresas que esta arte lhes reserva...
O cinema soube explorar bem o assunto e produziu bastante filmes do gênero “horror da múmia”. Destacam-se: A Múmia, com Boris Karloff; A Praga da Múmia, com Lon Chaney; The mummy, com Christopher Lee e Peter Cushing; A mão da múmia (40), com Tom Tyler; Na sombra da múmia, com Lon Chaney; O Túmulo da Múmia,
também com Lon Chaney; e antes mesmo destes clássicos, já em 1909
estreiava “The Mummy of King Ramses”, depois em 1911, “A Múmia Viva”, e
em 1915, “Mummy and the Humming Bird”, entre outros! Existe
provavelmente cerca de mais de trinta filmes sobre múmias, sempre
retratando os aspectos sobrenaturais onde a ressurreição da múmia parece
evidente. Como uma antiga profecia, elas sempre estrangulam e matam os
profanadores dos seus túmulos, mas uma coisa é certa, já existiram casos
verídicos de pesquisadores ou esmo ladrões e profanadores de túmulos
egípcios que foram inexoravelmente castigados ao abrirem túmulos
escavados em solo egípcio. Não foram estrangulados por nenhuma múmia
viva, mas com certeza morreram... Parece que a maldição ganhou um certo
crédito pois dentre aqueles antigos túmulos, verdadeiras câmaras
mortuárias, fungos e bactérias necrófagas pululam aos milhares, além de
insetos venenosos como escorpiões e aranhas. É provável que um indivíduo
tão frágil como o homem moderno, tão desprotegido e cético, muitos
destes, na ânsia de ficar milionário saqueando algum tesouro de um
túmulo de faraó, tenham contraído alguma doença malígna nos pulmões,
morrendo de alguma infecção ou peste oriunda da própria atmosfera da
câmara mortuária! Mas não somente doenças pulmonares ou de pele causada
por bactérias necrófagas, mas também vítimas de terríveis armadilhas
projetadas pelos antigos egípcios com a específica função de castigo e
morte. Poços com fundo repleto de lanças e espetos parecem esperar há
mais de 3500 anos o corpo de algum infeliz! Em outros casos, morte por
desabamento de enormes blocos de pedra ao forçar a entrada de algum
túmulo que automaticamente aciona um dispositivo mecânico onde todas as
portas se fecham por deslocamento de enormes pedras e os indivíduos
morrem asfixiados como quem foi emparedado! Estes acidentes raramente
ouvimos falar, mas fazem parte do contexto ligado às maldições das
múmias. Dentre as maldições antigas, outra que parece ter vingado
ocorreu quando alguns idiotas, americanos para variar, transformaram os
corpos de várias múmias de plebeus em papel para indústria. O papel, não
possuindo as características básicas de boa qualidade, acabou sendo
usado para embrulhar carne. Mas todos os indivíduos que comeram carne
embrulhadas com este papel, morreram! Este fato curioso foi narrado em
um documentário muito interessante intitulado “Múmias – além da morte”,
do qual possuo uma cópia em vídeo para os meus estudos.

Por volta do ano de 1881, Gaston Maspere, um célebre egiptólogo
da França, junto com uma equipe bem preparada de pesquisadores,
cientistas e arqueólogos, além é claro, do auxílio básico e fundamental
dos nativos egípcios, homens que se predispõem a fazer a parte bruta do
serviço, as escavações e o transporte de pedras ou areia dos sítios
arqueológicos, eles encontraram uma enorme câmara mortuária ao fundo de
uma rocha. Para maior espanto dos mesmos, acharam urnas, caixas,
estátuas raríssimas como peças de arte, várias múmias e objetos ligados
aos ritos funerários. Como se não bastasse o achado, Gaston Maspere, que
também era na época o diretor do museu do Cairo, descobriu que se
tratavam das múmias dos maiores imperadores do Egito, Amenophis, Ramsés
II, Thutmosis III e Sethos. Sendo Ramsés II um dos mais importantes
faraós do antigo Egito. Também no ano de 1922, pesquisadores descobriram
o túmulo de Tutankamon, e o curioso é que uma sinistra maldição estava
ali escrita em hieróglifos. A inscrição parecia amaldiçoar com a morte
todos os vivos que viessem a violar o sagrado túmulo.E é fato comprovado
que diversos dos que estiveram envolvidos neste achado, acabaram tendo
mortes súbitas ou violentas, pois os tesouros ali encontrados atiçaram a
ganância e o ódio de muitos ladrões e saqueadores criminosos...
Concluindo, parece mesmo que é o fantasma da morte que está por
detrás de todos estes ritos fúnebres, maldições, medos, condenações,
desde já os primevos seres humanos, que ainda mal sabiam o significado
da morte, culminando nas primeiras civilizações como as da Mesopotamia
até o Egito. Falei do Egito, mas não posso esquecer que aqui nas
Américas, civilizações antigas como a dos Maias, Incas e Astecas, também
tinham o costume de mumificar seus mortos, na esperança de conservar o
corpo para uma suposta ressurreição. Mas, enquanto nada ainda ocorreu,
ninguém ressuscitou até agora, cabe a nós invocarmos todas as lendas e
maldições, histórias e fatos, nomes que estão ligados a estas
fascinantes civilizações do passado, pessoas que de uma forma ou de
outra sonharam um dia... Livros, bons filmes, tudo deverá contribuir
para que vivam para sempre na memória das gerações futuras. Somente
assim, conservando, cultuando e respeitando todas as manifestações
culturais e artísticas é que a humanidade terá uma segunda chance de
regeneração...





































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